sexta-feira, 18 de março de 2016

Problema sinótico: contradição sobre a cura dos cegos de Jericó





Por Davi Faria de Caires*

 


Introdução

A narrativa da cura dos cegos de Jericó contém diferenças e contradições aparentes.  Este milagre é registrado nos três primeiros evangelhos:


“E, saindo eles de Jericó, seguiu-o grande multidão. E eis que dois cegos, assentados junto do caminho, ouvindo que Jesus passava, clamaram, dizendo: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de nós! E a multidão os repreendia, para que se calassem; eles, porém, cada vez clamavam mais, dizendo: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de nós! E Jesus, parando, chamou-os, e disse: Que quereis que vos faça? Disseram-lhe eles: Senhor, que os nossos olhos sejam abertos. Então Jesus, movido de íntima compaixão, tocou-lhes nos olhos, e logo viram; e eles o seguiram.” (Evangelho São Mateus 20.29-34, Almeida Corrigida Fiel)


“Depois, foram para Jericó. E, saindo ele de Jericó com seus discípulos e uma grande multidão, Bartimeu, o cego, filho de Timeu, estava assentado junto do caminho, mendigando. E, ouvindo que era Jesus de Nazaré, começou a clamar, e a dizer: Jesus, filho de Davi, tem misericórdia de mim. E muitos o repreendiam, para que se calasse; mas ele clamava cada vez mais: Filho de Davi! tem misericórdia de mim. E Jesus, parando, disse que o chamassem; e chamaram o cego, dizendo-lhe: Tem bom ânimo; levanta-te, que ele te chama. E ele, lançando de si a sua capa, levantou-se, e foi ter com Jesus. E Jesus, falando, disse-lhe: Que queres que te faça? E o cego lhe disse: Mestre, que eu tenha vista. E Jesus lhe disse: Vai, a tua fé te salvou. E logo viu, e seguiu a Jesus pelo caminho.” (Evangelho de São Marcos 10.46-52, Almeida Corrigida Fiel)


“E aconteceu que chegando ele perto de Jericó, estava um cego assentado junto do caminho, mendigando. E, ouvindo passar a multidão, perguntou que era aquilo. E disseram-lhe que Jesus Nazareno passava. Então clamou, dizendo: Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim. E os que iam passando repreendiam-no para que se calasse; mas ele clamava ainda mais: Filho de Davi, tem misericórdia de mim! Então Jesus, parando, mandou que lho trouxessem; e, chegando ele, perguntou-lhe, dizendo: Que queres que te faça? E ele disse: Senhor, que eu veja. E Jesus lhe disse: Vê; a tua fé te salvou. E logo viu, e seguia-o, glorificando a Deus. E todo o povo, vendo isto, dava louvores a Deus.” (Evangelho de São Lucas 18.35-43, Almeida Corrigida Fiel)


A partir do relato bíblico supracitado, observemos o que diz o relato de cada evangelista:

Mateus:
- Diz que eram dois cegos;
- Curados na saída da cidade;
- E não cita o nome deles.

Marcos:
- Afirma que era um cego;
- Curado na saída;
- Cita o nome: Bartimeu.

Lucas:
- Atesta que era um cego;
- Este ficou sabendo de Jesus na entrada da cidade;
- Era inoportuno, insistente e quase foi barrado pela multidão pelo seu
Infortúnio.


Análise

Os três relatos são distintos e se complementam. A bíblia foi inspirada por Deus, mas foi escrita por homens. Homens foram inspirados por Deus, mas o jeito de escrever é particular de cada autor. Contudo, harmoniosamente ela se complementa. No caso dos cegos de Jericó, os três relatos se complementam.
Lucas narra que o cego procurou Jesus na entrada da cidade, e perseguiu-o de forma insistente. Acrescentou inclusive que a multidão tentou barrá-lo, pois estava importunando pelo barulho que estava fazendo. Por Marcos, sabemos que o nome de um cego era Bartimeu. Mateus diz que eram dois cegos, enquanto Marcos e Lucas relatam que era um cego.

Conclusão
Com isso, podemos inferir que eram dois cegos que, no início da cidade começaram a seguir Jesus. Porém, Bartimeu era insistente, contundente e barulhento. Por isso chamou a atenção de todos. O outro cego era mais contido, e estava acompanhando Bartimeu. Ele não estava tão determinado quanto Bartimeu. Lucas acrescenta também que eles perseguiram Jesus. Não sabemos por quanto tempo eles perseguiram Jesus, mas não desistiram. Mas a multidão atrapalhava. E chegando ao final da cidade, com provável diminuição da multidão, e devido à insistência principalmente de Bartimeu, Jesus efetua a cura, no final do trajeto.

Aplicação
Essa passagem me faz lembrar a parábola da viúva que importunava o juiz (Lucas 18). Foi atendida por sua insistência e persistência. De igual modo, Bartimeu é atendido por sua persistência. Enfrenta a multidão, atravessa a cidade e segue clamando a Jesus até o final da cidade, e recebe a cura.
Por outro lado, o outro cego também recebe a cura, mas é menos 'inoportuno'. Temos outra aplicação aí. Este cego é menos insistente. Apenas acompanha o amigo, e recebe a cura por através da insistência do seu amigo. Isso nos mostra a importância dos relacionamentos. Mesmo que estejamos apenas rastejando na fé, podemos ser muito abençoados ao andarmos ao lado de pessoas fiéis, piedosas, intercessoras e persistentes.


Escrito em 02 de Março de 2015


Sobre o autor:
Davi Faria de Caires
Cristão protestante, casado, residente e natural de Campinas-SP, é membro da Igreja Batista Regular no Jd Liza (Campinas-SP). Músico formado pela Escola Livre de Música (UNICAMP), formado em Psicologia (PUCCAMP) e em Gestão de Recursos Humanos (UNIDERP); graduando em Teologia pela Faculdade Batista Teológica de Campinas (FTBC) e pelo Centro Universitário Filadélfia (UniFil). Psicólogo clínico com atuação em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) e em Desenvolvimento Humano Organizacional (DHO) na Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP). Criador do Grupo de Estudos Teologia com Propósito®Contato: davifariadecaires@gmail.com


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6 comentários:

  1. Olá, Davi!
    Ótimo artigo. Porém eu ainda acrescentaria uma outra possibilidade para o outro cego:

    É possível que o outro cego fosse criança, mulher ou samaritano e por isso não foi citado pelos outros sinóticos, já que esses grupos, geralmente não eram citados. Eu particularmente, penso que fosse uma criança.

    Casos similares ocorrem por exemplo, nas multiplicações dos pães e peixes. Em ambas as vezes, a bíblia cita um número e em seguida observa: "Fora mulheres e crianças".

    Enfim, é só mais uma possibilidade. Espero ter acrescentado em algo.

    Shalom Ha'Shem!

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    1. Ótima observação e análise pertinente, Pr Renato Oliveira. Obrigado. Abraços.

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  2. Gostei muito do estudo. Serviu-me sobremaneira aos meus interesses. Deus o abençoe!

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  3. Gostei, abriu um novo olhar sobre o tema.

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