Por Davi
Faria de Caires*
Cinco livros são classificados como poéticos: Jó,
Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos, que podem também ser
subdivididos em livros de Sabedoria, ou Sapienciais (Jó, Provérbios e Eclesiastes), e livros Hínicos (Salmos e Cântico dos Cânticos).
OS LIVROS POÉTICOS
A despeito de haverem alguns trechos
esparsos no restante da bíblia que possuem estrutura poética, nestes livros
vemos uma presença marcante de rima, ritmo e expressões figurativas básicas,
tais como símile, metáfora, personificação, apóstrofe e hipérbole, entre outros.
Uma característica peculiar da poesia
hebraica é utilizar-se de paralelismos. Um paralelismo é identificado por ritmo de ideias, ao invés de ritmo de sons, tal como conhecemos na
poesia ocidental. Há paralelismos de diversas formas: paralelismo sinonímico,
antitético, sintético, analítico, climático, emblemático e quiasmo. Uma grande
vantagem desse recurso é que não ele não se perde quando há tradução, pois como
já foi dito, o paralelismo é baseado em ideias, e não entre os sons. Portanto,
mesmo em textos traduzidos, como temos acesso hoje, podemos ainda identificar
os paralelismos em toda riqueza original da poesia hebraica.
OS LIVROS DE SABEDORIA (OU SAPIENCIAIS)
Salomão é reconhecidamente um homem sábio, e o maior de sua época. Mas
não foi o único de seu tempo. Houveram outros que o precederam, e também outros
que o sucederam. Os sábios daquele tempo tinham maior preocupação com a vida
prática do que com a sabedoria filosófica. Interessavam-se profundamente com a
ética e a aplicação correta desta à vida humana. Interessavam-se pelo chão da
vida. Eram filósofos de conversa, tal como uma mulher do lar e um homem do
campo. Aqueles sábios procuravam aplicar o conhecimento e a sabedoria não
apenas para que o homem pudesse viver melhor, mas sim para que o homem tivesse
uma perspectiva norteadora em termos de perseguir um ideal.
Se compararmos o sábio com um profeta e com um sacerdote, veremos que
possuem abordagens distintas para os mesmos fenômenos. Por exemplo: em relação
ao pecado, o sacerdote diria que é
uma profanação. O profeta diria que é um pecado. E o sábio diria que é uma
loucura. Portanto, o sábio analisava os fatos em uma perspectiva moral com
vistas às consequências dos atos, que podiam resultar em felicidade ou
desgraça. São três os livros sapienciais: Jó, Provérbios e Eclesiastes. Jó contém sabedorias para um correto
entendimento das provações da vida. Provérbios
oferece sabedoria para crescimento e disciplina na vida. E Eclesiastes, por sua vez, oferece sabedoria para encontrar o
verdadeiro significado da vida.
JÓ
Jó é um livro de autoria anônima,
embora os autores mais prováveis sejam Moisés e Salomão. Caso tenha sido
escrito por Moisés em Midiã, o livro certamente sofreu modificações nos tempos
de Salomão. Mas fato é que a autoria é incerta. Este livro tem como objetivo
central mostrar como Deus usa as adversidades e a prosperidade para amadurecer
o seu povo. Vê-se de modo claro neste livro, a soberania de Deus sobre Satanás,
e que este último pode ser usado por Deus para cumprir Seus planos. Aliás,
vemos que Satanás é o grande adversário do homem.
Vemos neste livro a resposta à clássica
pergunta: porque sofre o justo? Aliás, o erro dos amigos de Jó foi considerarem
que uma pessoa rica e saudável está bem diante de Deus. Ao final do livro, o
próprio Jó compreende que ter saúde ou riqueza não significam ter um bom
conceito diante de Deus. Aliás, neste livro, vemos que, a despeito de ter saúde
ou riquezas terrenas, a religião verdadeira é a confiança em Deus, tendo como
alvo a ressurreição e o juízo final: “Porque eu sei que o meu Redentor vive, e
que por fim se levantará sobre a terra. E depois de consumida a minha pele,
contudo ainda em minha carne verei a Deus” (Jó 19.25-26 - ACF).
SALMOS
Salmos são um hinário, e o maior livro
da bíblia, com 150 capítulos. Este livro é uma das maiores fontes de inspiração
para oração e louvor a Deus. O livro de Salmos tornou-se o manual de instrução
de Israel para oração e culto, tendo em vista que seu conceito dominante é
adorar a Deus em oração. Foi escrito por diversos autores: Moisés, Davi,
Salomão, Asafe, Filhos de Corá, Hemã, Etã, Ezequias, Jeremias, Ageu, Zacarias e
Esdras, além de outros salmos órfãos, de autoria desconhecida. Contudo, quase a
metade dos 150 salmos foi escrita por Davi, homem que teve larga experiência
como pastor, músico, poeta, guerreiro, fugitivo, amante, teólogo e homem de
Estado. Este livro foi escrito em um período de mil anos, tendo início em
1430aC, tendo por Moisés o primeiro escritor deste livro.
Os salmistas escreveram sobre infortúnios, vitórias e louvores nas
muitas dificuldades do viver diário, dando expressão e lado emocional da
religião. O estilo deste livro é poético, contendo poemas líricos, paralelismos
e diversas figuras de linguagem, tais como símile, metáfora, alegoria,
metonímia, sinédoque, hipérbole, personificação, apóstrofe, antropomorfismo e
antropopatia. E quanto ao conteúdo, são
classificados em diversas categorias, tais como ações de graças, lamento ou
queixa, imprecatórios, históricos, messiânicos, louvor e didáticos.
PROVÉRBIOS
Salomão foi o autor dos capítulos 1 a
24 deste livro. Agur foi o autor do capítulo 30, e Lemuel foi o autor do
capítulo 31. Este livro foi escrito no período entre 950 e 700 aC. Salomão
proferiu 3 mil provérbios a respeito de muitas áreas da vida, muito mais que os
800 provérbios que estão incluídos no livro de Provérbios. Este livro tem como
objetivo, que uma mente disciplinada e um modo de vida orientado por princípios
divinos trazem grandes benefícios. E também inversamente, este livro ensina que
a indisciplina e a falta de princípios trazem malefícios. Este livro também
adverte acerca de perigos que resultam em seguir os ditames da natureza
interior e das paixões inferiores.
Em Provérbios, vemos uma apologia à
Sabedoria, especialmente no trecho do capítulo 8, versículos 22 a 31, onde
aponta que a Sabedoria existe desde a eternidade. Do ponto de vista
neotestamentário, a Sabedoria constante em Provérbios é Cristo. Conforme 1
Coríntios 1.24,30, Cristo é a Sabedoria de Deus, senão, vejamos:
“Mas para os que são chamados, tanto judeus como
gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus. Mas vós
sois dele, em Jesus Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e
justiça, e santificação, e redenção.”
Paulo
também ensina, em Colossenses 2.3: “[Cristo],
em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência.”
ECLESIASTES
Cântico dos Cânticos, Provérbios e Eclesiastes foram escritos em fases
distintas da vida de Salomão. Cântico dos Cânticos foi escrito em sua
juventude, Provérbios foi escrito na meia-idade e Eclesiastes, por sua vez, foi
escrito por Salomão na velhice. Diferentemente de Provérbios, que possui mais
de um autor, Eclesiastes foi escrito unicamente por Salomão, em 935aC. O
objetivo do escritor neste livro foi demonstrar, cientificamente e
filosoficamente, a futilidade da vida sem Deus, bem como demonstrar também a
satisfação e alegria de viver na percepção da soberania divina.
Vale ressaltar que a menção de Deus como Criador aparece pela primeira
vez na Bíblia em Eclesiastes: “Lembre-se de seu Criador” (12.1). Esta
referência aparece posteriormente em outros livros: Isaías 40.28; Romanos 1.25;
1 Pedro 4.19. Por fim, vale mencionar que este livro é falsamente acusado de
conter traços agnósticos, por revelar um notório pessimismo e naturalismo em
algumas partes. Mas essa acusação cai por terra na conclusão do livro, onde o
autor reconhece e expressa solenemente que o significado verdadeiro da vida só
pode ser percebido quando a pessoa teme a Deus e guarda os seus mandamentos.
CÂNTICO DOS CÂNTICOS
Escrito por Salomão em sua juventude, esse livro
também recebe o título de Cantares de Salomão. Escrito em 950 aC, este livro
foi escrito logo após Salomão tornar-se rei. Seu reinado durou de 970 a 930aC.
Portanto, é o livro canônico mais antigo deste autor. Nesta época, ele possuía
cerca de 60 a 80 mulheres e concubinas. Número pequeno, em comparação com o
harém posterior que veio a ter, de 700 mulheres e 300 concubinas.
Alguns teólogos ao longo da história
chegaram a afirmar que este livro não deveria fazer parte do Cânon, tendo em
vista a linguagem explícita de amor conjugal entre Salomão e a Sulamita. Embora
ter sido escrito especialmente para os jovens, a leitura deste livro foi
proibida para jovens menores de 30 anos no período intertestamentário. Este
livro retrata o a relação amorosa, íntima e conjugal entre Salomão e sua esposa
Sulamita. O estilo deste livro é um idílio lírico. Idílios são figuras de cenas
rurais agrupadas para se contar uma história. O melhor método de interpretação
para ser utilizado neste livro é o ponto de vista típico, que concilia o ponto
de vista literal e o ponto de vista alegórico. Literalmente, todo livro deve
ser entendido como a expressão do amor conjugal entre os dois personagens. E
algumas passagens podem e devem ser interpretadas com tipos alegóricos da
representação da relação amorosa entre o Senhor e seu povo Israel, e também o
relacionamento de amor entre Cristo e a Igreja. Nesta perspectiva, os dois
objetivos deste livro (literal e alegórico), completam-se admiravelmente.
REFERÊNCIA
Ellisen,
Stanley. Conheça melhor o Antigo
Testamento: um guia com esboços e gráficos explicativos dos primeiros 39 livros
da Bíblia. São Paulo: Editora Vida, 2007.
Sobre
o autor:
Davi Faria de Caires
Cristão protestante, casado, residente e natural de Campinas-SP, é membro da Igreja Batista Regular no Jd Liza (Campinas-SP). Músico formado pela Escola Livre de Música (UNICAMP), formado em Psicologia (PUCCAMP) e em Gestão de Recursos Humanos (UNIDERP); graduando em Teologia pela Faculdade Batista Teológica de Campinas (FTBC) e pelo Centro Universitário Filadélfia (UniFil). Psicólogo clínico com atuação em Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) e em Desenvolvimento Humano Organizacional (DHO) na Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP). Criador do Grupo de Estudos Teologia com Propósito®. Contato: davifariadecaires@gmail.com
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