segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Efésios, Visão Panorâmica (Aula 01)




Aula 01 da matéria “Aos Efésios”, ministrada no Grupo de Estudos Teologia com Propósito, em 19 de Fevereiro de 2017, por Luís Roberto de Souza*


INTRODUÇÃO
Meu nome é Luís Roberto de Souza. Sou cristão reformado de tradição batista. Estudo Teologia de modo autodidata há vinte anos. Quero deixar claro que o assunto não termina em minhas observações. O objeto da explanação é apenas de carácter introdutório. O objetivo é listar algumas informações indispensáveis ao se ler uma carta bíblica. Independente do autor ou da obra é preciso ter em vista elementos básicos que ajudarão o leitor a se situar durante sua leitura de uma Epístola. A princípio irei expor sobre:


Autor/Autoria

Destinatário

Contexto Histórico.


Tendo em vista elementos básicos como estes o leitor atual está apto a inferir com menor chance de erros.


AUTOR/AUTORIA
A autoria de Paulo foi comumente aceita até o século 19. Após esse período com algumas intervenções de crítica textual, alguns eruditos passaram a questionar se realmente Paulo poderia ter sido o autor. As razões que os levaram ao questionamento serão expostas adiante no decorrer da aula. Assumo como posição a ser defendida que o autor da carta aos Efésios é Paulo, o apóstolo dos gentios.

Paulo era judeu da tribo de Benjamin (Filipenses 3:5 – “Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; segundo a lei, fui fariseu”). Homem culto, educado aos pés de Gamaliel (Atos 22:3 – “Quanto a mim, sou judeu, nascido em Tarso da Cilícia, e nesta cidade criado aos pés de Gamaliel, instruído conforme a verdade da lei de nossos pais, zeloso de Deus, como todos vós hoje sois.”). Essa formação no contexto judeu correspondia ao que havia de melhor dentro do farisaísmo judaico. Porém Paulo não tinha apenas a influência judaica em sua formação. Nascido em berço greco-romano, ele tinha pleno conhecimento do direito romano e da cultura helênica. Em poucas palavras Saulo ou Paulo era um erudito. Homem estudado, policultural e poliglota. Alguém que tinha um preparo acima dos demais apóstolos. O [apóstolo] que Deus de modo soberano usou para revolucionar o Mundo de sua época. Paulo transitava no diálogo com seus irmãos judeus, com seus compatriotas Romanos e com o povo bárbaro.

O chamado de Paulo é relatado por ele mesmo em Efésios 1:1: "Paulo apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus". Embora durante seu ministério ele tenha precisado defender esse apostolado, hoje é consenso que Paulo, depois de Cristo, é a mente mais brilhante que a humanidade conheceu. Isso logicamente não faz dele alguém perfeito. ou livre de erros. Mas como apóstolo ele foi perfeito, assim infere Jonh Stott: "ele apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus e portanto um mestre cuja a autoridade do próprio Jesus Cristo em cujo inspiração escreve". Tendo em mente que Paulo é comumente aceito como autor de Efésios, quero expôr alguns motivos que levaram eruditos a questionarem a autoria de Paulo em relação a Efésios a partir da crítica textual no século 19, por alguns estudiosos que basearam-se na estrutura literária e linguística.

As principais argumentações contra a autoria de Paulo são:

o estilo literário de Efésios não tem paralelo com as cartas inequivocamente reconhecidas como Paulinas. Ex: Coríntios.

Na carta aos Efésios existe o uso de palavras e expressões com um sentido diferente ao usado pelo mesmo autor em outras cartas. Exemplo: a expressão "as nações" (ta ethne) em outras cartas significam "não judeus", mas em Efésios significa "não gentios". Isso denotaria outra autoria.

Usualmente Paulo escreveu cartas com tratativas apologéticas. Isso não ocorre em Efésios. Em toda a carta não é identificado pelo menos em evidência que Paulo como usualmente fez em outras epístolas tinha um assunto doutrinário a tratar.

Alguns eruditos ainda dizem que o conhecimento dos cristãos em 60/63, data aceita para o envio, não era tão refinado e a estrutura eclesiástica ainda não atendia a padrões tão refinados como em Efésios. Ou seja, teologicamente falando, a carta seria anacrônica se fosse escrita em 60/63 d.C.

A tônica das epístolas Paulinas quase sempre eram: 1. Pecado em meio à igreja; 2. Dissensões; 3. Combate ao gnosticismo grego; 4. Combate as judaizantes. Essa temática não ocorre em Efésios.


Listados alguns argumentos dá crítica textual, quero deixar para responder estes questionamentos no final da aula.


DESTINATÁRIO
Tendo posto sobre a autoria, quero falar sobre os destinatários: a igreja em Éfeso e a cidade de Éfeso. Éfeso era a capital do império romano na Ásia menor, atual Turquia. Era uma cidade cosmopolita, tinha acesso ao mar Mediterrâneo. Era considerado o corredor do mundo na época de Paulo. Éfeso era uma cidade de cultura grega. Orgulhosamente ostentava o templo de Artêmis, a deusa grega da caça, da sensualidade e da virgindade. A influência filosófica grega sobre os romanos era tão superior que mesmo sendo politicamente subjugados, o culto grego foi incorporado pelos romanos. O que era para os gregos Artêmis, para os romanos era Diana. Isso é sincretismo religioso, tão presente hoje.

Paulo viveu por três anos em Éfeso. A cidade foi ainda moradia de Timóteo, seu pupilo. E segundo a tradição, aquela igreja foi ainda pastoreada por João, o discípulo amado, de onde teria escrito o Evangelho e suas três Epístolas. Algumas tradições afirmam que Maria mãe de Jesus morou ali com João até a morte. O que tem certo sentido como o relato joanino:


João 19:25-27: “E junto à cruz de Jesus estava sua mãe, e a irmã de sua mãe, Maria mulher de Clopas, e Maria Madalena. Ora Jesus, vendo ali sua mãe, e que o discípulo a quem ele amava estava presente, disse a sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa.”


A partir de Éfeso o evangelho avança para Europa e África. As sete igrejas de Apocalipse estão localizadas na Ásia menor e segundo a tradição,  foram frutos dos trabalhos daquela igreja. É válido lembrar ainda que a economia de Éfeso não girava em torno somente dos dividendos portuários. Lucas registra em Atos que o comércio religioso era grande e rentável. Vale lembrar ainda que nenhum manuscrito anterior ao século IV traz a expressão "Em Éfeso" presente no início da carta, por isto, a grande maioria dos eruditos assume que a carta foi endereçada a todas as igrejas da Ásia menor, e que devido à importância e relevância da comunidade de Éfeso a expressão fora incorporada posteriormente. A princípio a carta seria como uma encíclica, ou seja, deveria circular entre todas as igrejas. Isso pode responder a ausência de particularidades como citado acima no restante do acervo Paulino.

Tendo exposto sobre o autor e sobre os destinatários, quero terminar falando sobre o contexto histórico.


CONTEXTO HISTÓRICO
Efésios é também conhecida por integrar o grupo das chamadas “Epístolas da prisão". Foi escrita quando Paulo cumpria pena domiciliar imposta por Roma. As influências religiosas dá época eram: (1) Os judaizantes, já que a igreja de Éfeso apesar de maioria gentílica era também composta por judeus, como relatado em Atos 19.1-9. (2) Gnosticismo grego, que apesar de ter surgido antes da era cristã já havia se incorporado ao cristianismo negando a encarnação de Cristo; (3) e as diversas religiões de mistério gregas e romanas. Paulo é acusado por alguns de ter recebido influencia destas religiões e de ter tentado fazer esse sincretismo.

O termo "mistério" usado repetidamente por Paulo em Efésios é usado em Colossenses para explicar a revelação da IGREJA formada também por gentios. Este é o principal argumento dos que fazem tal acusação.

Tendo em mente estes três fatores, (1) autor, (2) destinatário e (3)  contexto histórico, a leitura da carta pode seguir tendo as possibilidades de equívocos mitigados. O tripé básico para a compreensão básica de qualquer que seja a carta é este. Sem essas noções, o caminho para o erro é potencialmente alto.


CONCLUSÃO

A carta aos Efésios fora escrita com particularidades não comparáveis em outras cartas Paulinas. A carta aos Efésios não trata de nenhum problema doutrinário. A carta aos Efésios é uma carta circular. E por fim, acrescento duas curiosidades sobre a carta: (1) a carta aos Efésios não menciona a segunda vinda de Cristo; (2) a carta aos Efésios não trata de escatologia como a maioria das outras cartas paulinas


PERGUNTAS & RESPOSTAS

PERGUNTA: Paulo foi educado aos pés de Gamaliel. Quem foi Gamaliel?
RESPOSTA: Gamaliel foi um mestre judeu doutor da lei. Era a maior autoridade da religião judaica dá época. Contextualizando, era a "Havard" do farisaísmo


PERGUNTA: Qual a diferença entre essa carta e a igreja de Efésios em apocalipse?
RESPOSTA: Entre a escrita desta carta e a escrita do apocalipse já haviam se passado décadas. Efésios foi escrito em 60/63 dC. Apocalipse escrito em 90/95. Perceba na leitura de Atos 19 que houve um avivamento naquela cidade. Demônios eram expulsos, milagres ocorriam, a sociedade mudava de comportamento. A literatura pagã junto com a religião era abandonada. Quase trinta anos após, o comportamento da igreja infelizmente mudara.


PERGUNTA: Tendo em vista que Paulo sempre tratou de escatologia nas demais cartas, porque em Efésios o autor não aborda este assunto?
RESPOSTA: Aparentemente ou claramente não. Mas minha opinião é que por se tratar de uma carta circular, assuntos peculiares foram omitidos. Por exemplo, aos Tessalonicenses e aos Coríntios onde havia questionamentos, Paulo faz a explanação. Outro ponto é que não há intenção em tratar o assunto de um grupo. O tema da epístola como veremos na próxima aula, é eclesiologia. E também não há a obrigatoriedade de abordar um tema ou um escopo pré-definido.


PERGUNTA: O que mais você destacaria para reflexão de conhecimento doutrinário e uso prático no conteúdo dessa carta?
RESPOSTA: Paulo é prático em dois sentidos em Efésios. (1) Ao dizer quem é a igreja, e onde está a igreja e (2) a partir do capítulo 4 ao dizer como vive a igreja na prática. A carta resolve o problema da crise de identidade atual. O estudo de um convite a triste contemporaneidade da igreja brasileira


PERGUNTA: Gamaliel, por ser doutor da lei, também foi reformador da lei? Ou seja, Gamaliel modificou a lei, tornando-a mais rígida?
RESPOSTA: O judaísmo era segmento em seitas. Existiam várias facções religiosas na época. Gamaliel era fariseu. Ele interpretava a lei.


PERGUNTA: Sofrendo com a ideia dos judaizantes e dos gnósticos, podemos dizer que a carta tem um caráter apologético?
RESPOSTA: Claramente não. Dentre todos eruditos que consultei, apenas R.N. Champlin afirma ser uma defesa ao gnosticismo. Mas se levarmos em conta a questão da igreja agora aberta aos gentios isso implica em um golpe no exclusivismo judeu. E também ao conhecimento do "mistério" por todos também não deixa de ser uma defesa contra o gnosticismo.


PERGUNTA: Os 613 preceitos foram dados por Deus ao povo por meio de Moisés? Ou foi interpretação e acréscimo dos rabinos?

RESPOSTA: Os 613 mandamentos foram uma espécie de resumo feito a partir do pentateuco. São mandamentos extraídos dos ensinos de Moisés. Esses preceitos foram compilados e enumerados somente no século XII, por Maimônides.


PERGUNTA: Qual o principal objetivo dessa carta?
RESPOSTA: Este será assunto da próxima aula. Mas a carta é um tratado da eclesiologia, o livro responde perguntas como: (1) Quem é o cabeça da igreja; (2) Quem é a igreja; (3) Quem fez a igreja; (4) Quem sustenta a igreja; (5) Pra que fez a igreja; (6) Como vive a igreja, etc.


PERGUNTA: Considerando esse trecho da aula: “Vale lembrar ainda que nenhum manuscrito anterior ao século IV trás a expressão "Em Éfeso" presente no início da carta”, pergunto, levando em conta que a crítica textual moderna aceita hoje os manuscritos posteriores datados do V século, podemos concluir que a expressão “Em Éfeso" consta no início do manuscrito original?
RESPOSTA: Sobre a idade anterior ao século IV é fato. Mas a arqueologia é algo dinâmico e a qualquer momento podem surgir novas cópias. Com relação a conclusão, eu creio que é algo perigoso de se afirmar. Não temos o original. Por outro lado é irrelevante creditar algum tipo de insuficiência na idoneidade da carta. O tratado é universal direcionado a toda igreja. Na minha opinião, qualquer que fosse o destinatário, não influenciaria o conjunto da obra. Vale lembrar que ainda temos o testemunho da geração posterior aos apóstolos. Alguns pais da igreja ratificam a igreja em Éfeso como destinatária.


PERGUNTA: Atos 19 menciona que Paulo viveu por dois anos em Éfeso. Você mencionou três anos. Afinal, são três anos ou dois anos?
RESPOSTA: Essa é a afirmação Lucana. Porém Paulo antes já havia passado por Éfeso. O período foi "arredondado". O exato tempo é incerto.


PERGUNTA: Timóteo também não foi pastor em Éfeso?
RESPOSTA: Sim, Timóteo foi o sucessor apostólico: “Como lhe disse quando viajei para a Macedônia, espero que você fique aí em Éfeso, e procure impedir os homens que estão ensinando doutrinas falsas.” (1 Timóteo 1.3)



Professor Luís Roberto de Souza
Casado, 37 anos, Técnico em Eletrotécnica, possui curso básico em teologia, estuda teologia de maneira autodidata há 20 anos, é cristão Batista de tradição histórica. Contato: robertoluissouza78@gmail.com



Se você gostou deste artigo, está autorizado e incentivado a reproduzir e distribuir este material em qualquer formato, desde que informe o autor e cite a fonte. Não altere o conteúdo original e não o utilize para fins comerciais.








segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Arminianismo: Introdução e Cosmovisão - Pr. Dr. Carlos Augusto Vailatti [VÍDEO]


Assista na íntegra o simpósio de teologia arminiana ocorrido em 21 de Janeiro de 2017 no 1º Encontro de Teologia Arminiana em Campinas-SP, organizado pelo Blog Teologia com Propósito e ministrado pelo Pr. Dr. Carlos Augusto Vailatti: 





Pr. Dr. Carlos Augusto Vailatti
Doutor em Estudos Judaicos (com concentração em Estudos da Bíblia Hebraica) pela Universidade de São Paulo (USP); Mestre em Teologia (com especialização em Teologia Bíblica) pelo Seminário Teológico Servo de Cristo (STSC); Bacharel em Teologia pela Faculdade Betel / Instituto Betel de Ensino Superior (IBES); Bacharel em Teologia pela Escola Superior de Teologia (EST); Professor de diversas disciplinas bíblico-teológicas; Autor de livros, entre eles, "Expiação Ilimitada", pela Editora Reflexão.

Organizadores: Davi Faria de Caires e Luís Roberto de Souza

Realização: Blog Teologia com Propósito
http://www.teologiacomproposito.com/

Apoio: Igreja do Nazareno Campo Grande (Campinas-SP)
http://www.nazarenocampogrande.com/

domingo, 19 de fevereiro de 2017

BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO

ü  O que é o Batismo com o Espírito Santo?

ü  Será que todo cristão realmente é batizado com o Espírito Santo?

ü  Qual a evidência do Batismo com o Espírito Santo?


Assista a este debate entre um cristão tradicional e um cristão pentecostal, e tire essas e outras dúvidas sobre essa importante doutrina bíblica.




Participantes convidados:

Luís Roberto de Souza (Campinas-SP); Casado, 37 anos, Técnico em Eletrotécnica; Graduando em Tecnologia de Construção de Edifícios; Curso básico em teologia; estuda teologia de maneira autodidata há 20 anos; cristão Batista de tradição histórica. Escreve semanalmente no blog sobre o tema: “Teologia Paulina”, com ênfase nas cartas de Efésios a Filemon. E-mail de contato: robertoluissouza78@gmail.com


Daniel Vicente (Curitiba-PR)
Membro da Igreja Assembleia de Deus em Pinhais; Bacharel em Teologia pela Faculdade Cristã de Curitiba; Pós Graduado em Educação a Distância pela Faculdade São Braz; Pós-graduado em Metodologia do Ensino Religioso pela Faculdade São Braz; Mestrando em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).
E-mail de contato: danielvicente1984@gmail.com

Moderador:
Davi Faria de Caires (Campinas-SP)
Editor do Blog Teologia com Propósito.
E-mail de contato: teologiacomproposito@gmail.com


Esse debate é promovido pelo Blog Teologia com Propósito.
http://www.teologiacomproposito.com/


Participe de um Grupo de Estudos de Teologia, On-Line, Gratuito.

INSCREVA-SE:
http://www.teologiacomproposito.com/2015/12/grupo-de-estudos-on-line.html

Data do debate: 07/02/2016

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Continuísmo versus Cessacionismo: qual das visões está correta? [PARTE 3]





Transcrição do debate entre os teólogos Renato Oliveira Pimentel e Cleuberth Lima, sob o tema: "Continuísmo versus Cessacionismo", ocorrido dia 29 de Janeiro de 2017 no Grupo de Estudos “Teologia com Propósito”.


         Veja abaixo a posição de cada teólogo neste tema:


Renato Oliveira Pimentel:
“Eu pretendo defender a doutrina continuísta, visto que não existe em lugar nenhum das escrituras sagradas algo que diz o contrário a isso.”


Cleuberth Lima:
“Neste debate, irei defender o cessacionismo por acreditar que tal sistema teológico interpretativo é coerente que os textos bíblicos que tratam dos dons carismáticos.”


Confira abaixo o desenvolvimento da terceira (e última) parte deste debate, a partir das considerações finais de cada teólogo sobre o tema.

Para ler a primeira parte deste debate, clique aqui.

Para ler a segunda parte deste debate, clique aqui.


CONSIDERAÇÕES FINAIS DE CLEUBERTH LIMA:
Como homens que dedicaram suas vidas a Deus no transcorrer da história do cristianismo compreenderam a questão dos dons espirituais em seus respectivos tempos?

1. João Crisóstomo (344–407)

A passagem inteira (falando sobre 1 Coríntios 12) é muito obscura, mas a obscuridade é produzida por nossa ignorância dos fatos referidos e por sua cessação, fatos que ocorriam, mas agora não tem mais lugar. (Fonte: João Crisóstomo, Homilias em I Coríntios, 36.7 Crisóstomo está comentando 1 Co. 12:1-2 como introdução ao capítulo inteiro. Citado de 1-2 Coríntios in: Ancient Christian Commentary Series, 146.).

2. Agostinho (354-430)

Nos tempos antigos o Espírito Santo veio sobre os crentes e eles falaram em línguas que não haviam aprendido, conforme o Espírito concediam que falassem. Estes foram sinais adaptados ao tempo. Pois aquilo foi o sinal do Espírito Santo em todas as línguas [idiomas] para mostrar que o Evangelho de Deus era para ser espalhado a todas as línguas sobre a terra.  Isto foi feito por um sinal, e o sinal findou. (Fonte: Agostinho. Homilias sobre a Primeira Epístola de João, 6.10. Cf. Schaff, NPNF, First Series, 7:497-98).

3. Teodoreto de Ciro (393-466)

Em tempos antigos, aqueles que aceitaram a divina pregação e que foram batizados para a sua salvação, receberam sinais visíveis da graça do Espírito Santo trabalhando neles. Alguns falaram em línguas que eles não sabiam e que ninguém lhes havia ensinado, enquanto outros realizaram milagres ou profetizaram.  Os coríntios também fizeram essas coisas, mas não usaram os dons como deveriam ter usado. Eles estavam mais interessados em se mostrar do que em usar os dons para a edificação da igreja... Mesmo no nosso tempo a graça é dada para aqueles que são julgados dignos do santo batismo, mas não pode assumir a mesma forma que possuía naqueles dias. (Fonte: Teodoreto de Ciro. Comentário sobra a primeira epístola aos Coríntios, 240, 43; em referência à 1Co 12:1,7.  Citado de 1-2 Coríntios, ACCS, 117).

4. Martinho Lutero (1483-1546)

Na Igreja primitiva, o Espírito Santo foi enviado de forma visível.  Ele desceu sobre Cristo na forma de uma pomba (Mt. 3:16), e à semelhança de fogo sobre os apóstolos e outros crentes.  (Atos 2:3) Esse derramamento visível do Espírito Santo foi necessário para o estabelecimento da Igreja primitiva, como também foram necessários os milagres que acompanharam o dom do Espírito Santo. Paulo explicou o propósito destes dons miraculosos do Espírito em I Coríntios 14:22, “as línguas são um sinal, não para os que crêem, mas para os que não crêem”.  Uma vez que a Igreja tinha sido estabelecida e devidamente anunciada por estes milagres, a aparência visível do Espírito Santo cessou. (Fonte: Martinho Lutero, traduzido por Theodore Graebner [Grand Rapids, Michigan: Zondervan, 1949], pp  150-172. A respeito do comentário de Lutero sobre Gálatas 4:6.).

5. João Calvino (1509-1564)

Embora Cristo não declare expressamente se Ele pretende que esse dom [de milagres] seja temporário ou permaneça perpetuamente na Igreja, é mais provável que os milagres tenham sido prometidos apenas por um tempo, para dar brilho ao evangelho enquanto ele era novo ou em estado de obscuridade. (Fonte: João Calvino, Comentário sobre os Evangelhos Sinóticos, III:389.).

O dom de cura, como o resto dos milagres, os quais o Senhor quis que fossem trazidos à luz por um tempo, desapareceu, a fim de tornar a pregação do Evangelho maravilhosa para sempre. (Fonte: João Calvino, Institutas da Religião Cristã, IV: 19, 18.).

6. John Owen (1616-1683)

Dons que em sua própria natureza excederam completamente o poder de todas as nossas habilidades, essa dispensação do Espírito há muito cessou e onde ela agora é simulada por alguém, pode ser justamente presumida como um delírio entusiasmado. (Fonte: John Owen, Obras, IV:518.).

7. Thomas Watson (1620-1686)

Claro, há tanta necessidade de ordenação hoje como no tempo de Cristo e no tempo dos apóstolos, quando então havia dons extraordinários na igreja, os quais agora cessaram. (Fonte: Thomas Watson, As Bem-Aventuranças, 140.).

8. Mattew Henry (1662-1714)

O que eram esses dons nos é largamente dito no corpo do capítulo [1 Coríntios 12], ou seja, ofícios e poderes extraordinários, concedidos a ministros e cristãos nos primeiros séculos, para a convicção dos descrentes, e propagação do evangelho. (Fonte: Mattew Henry, Comentário Completo, em referência a 1 Coríntios 12).

O dom de línguas foi um novo produto do espírito de profecia e dado por uma razão particular, retirar o judeu e demonstrar que todas as nações podem ser conduzidas à igreja. Estes e outros sinais da profecia, começaram como sinais, e há muito cessaram e foram deixados para trás, e nós não temos nenhum incentivo para esperar um avivamento deles; mas, pelo contrário, somos direcionados para o chamado das Escrituras a mais certa palavra de profecia, mais certa que vozes dos céus, e ela nos orienta a tomar cuidado, a busca-la e se firmar nela. (Fonte: Mattew Henry, Prefácio ao Vol IV de sua Exposição do At e NT, vii.).

9. John Gill (1697-1771)

Agora esses dons foram concedidos comumente, pelo Espírito, aos apóstolos, profetas e pastores, ou anciãos da igreja, naqueles primeiros tempos: a cópia de Alexandria, e a versão Latina da Vulgata, dizem, “por um só Espírito”. (Fonte: Comentário de John Gill de 1 Coríntios 12:9).

Não; quando estes dons estavam presentes, nem todos os possuíam.  Quando a unção com óleo, a fim de curar o doente, estava em uso, ela só foi executada pelos anciãos da igreja, e não pelos seus membros comuns, que deveriam buscar o doente nesta ocasião. (Fonte: Comentário de John Gill de 1 Coríntios 12:30.).

10. Jonathan Edwards (1703-1758)

Nos dias de sua [Jesus] encarnação, os seus discípulos tinham uma medida dos dons miraculosos do Espírito, sendo habilitados desta forma para ensinar e fazer milagres.  Mas, depois da ressurreição e ascensão, ocorreu o mais completo e notável derramamento do Espírito em seus dons milagrosos que já existiu, começando com o dia de Pentecostes, depois da ressureição Cristo e Sua ascensão ao céu.  E, em consequência disto, não somente aqui e ali uma pessoa extraordinária era dotada de dons extraordinários, mas eles eram comuns na igreja, e assim continuou durante a vida dos apóstolos, ou até a morte do último deles, mesmo o apóstolo João, que viveu por cerca de cem anos desde nascimento de Cristo, de modo que os primeiros cem anos da era cristã, ou o primeiro século, foi a era dos milagres.

Mas, logo após a finalização do cânon da Escritura quando o apóstolo João escreveu o livro do Apocalipse, não muito antes de sua morte, os dons miraculosos tiveram seu fim na igreja. Pois, agora, a revelação escrita da mente e da vontade de Deus estava completa e estabelecida. Revelação na qual Deus havia perfeitamente gravado uma regra permanente e totalmente suficiente para Sua igreja em todas as eras.  Com a igreja e a nação judaica derrotadas, e a igreja cristã e a última dispensação da igreja de Deus estabelecidas, os dons miraculosos do Espírito já não eram mais necessários e, portanto, eles cessaram; pois embora eles tenham continuado na igreja por tantas eras, eles se extinguiram, e Deus fez com que fossem extintos porque já não havia ocasião favorável a eles.  E assim foi cumprido o que está dito no texto: “Havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; Havendo ciência, desaparecerá”.  E agora parece ser o fim para todos os frutos do Espírito tais como estes, e não temos mais razão de esperar que voltem. (Fonte: Jonathan Edwards, sermão intitulado “O Espírito Santo deve ser comunicado ao Santos para sempre, In na graça da caridade, ou amor divino”, em 1 Coríntios 13:8).

Os dons extraordinários foram dados para a fundação e o estabelecimento da igreja no mundo. Mas, depois que o cânon das Escrituras foi concluído e a igreja cristã foi plenamente fundada e estabelecida, os dons extraordinários cessaram. (Fonte: Jonathan Edwards, Caridade e seus frutos, 29.).

Senhoras e senhores do grupo Teologia Propósito, sinto-me imensamente honrado pelo convite para protagonizar ao lado do amável amigo e irmão Renato, mais um debate teológico neste grupo.

Como é sabido de todos, em apenas duas horas não é nada possível realizarmos uma discussão minuciosa com citação de teóricos e passagens da bíblia relacionadas ao assunto, com coerência interpretativa.

Outrossim, quanto ao tema, preciso deixar claro que cessacionistas ACREDITAM que Deus tem o poder e, querendo, pode realizar milagres em nossos dias. Não há nada que possa impedi-lo.

Concluo agradecendo a atitude amistosa do Renato durante a interação do começo ao fim. Parabéns! Parabéns também ao moderador pela direção inteligente, sensata e imparcial.

Obrigado!


CONSIDERAÇÕES FINAIS DE RENATO OLIVEIRA PIMENTEL:

Concordo Cleuberth, o tempo foi curto, mas espero podermos protagonizar outros [debates] com maior tempo. Agradeço a oportunidade de estar aqui no TP mais uma vez debatendo com um debatedor de tão alto nível como Cleuberth, e a todos que acompanharam educadamente, respeitando as regras do debate e dando atenção as nossas humildes opiniões sobre a bíblia que é viva.

Quero expressar um último sentimento acerca do continuísmo que é o que acredito...

Quando se diz respeito à profecia de Joel, eu não me lembro, no dia de pentecostes, do Sol ficando escuro e a lua tendo cor de sangue, nem me lembro de alguém sonhando e tendo visões naquele dia. Sangue, fogo e colunas de fumaças, também não estão na minha memória sobre os relatos daquele dia.

E alguém dirá: Mas provavelmente, aconteceram nos dias que se seguiram. E é exatamente aí que mora a questão!

A profecia não se referia apenas àquele dia em específico, mas a uma sequência de dias que começariam a partir dali. Isso nos faz pensar no seguinte: Onde está escrito quantos dias durou ou durariam os fatos descritos naquela profecia? Em lugar nenhum!

Assim como criam os pais da igreja, que declararam:


"Entre nós, com efeito, até o presente momento, existem carismas proféticos" (Justino de Roma - 100/165 d.C.)

"Deus conferiu do alto a graça e o dom divino da profecia e os homens que o "recebem" falam onde e como ele quer" (Irineu de lyon 130/212 d.C.)

"Ainda ouvimos muitos irmãos na igreja que possuem carismas proféticos e que pelo Espírito falam em línguas, revelam as coisas escondidas dos homens para sua utilidade e expondo os mistérios de Deus" (Irineu de lyon)

"Foi dito em uma visão (que ele teve): Peça e receberá!" (Cipriano de Cartago 200/258 d.C.)

"Esse Deus, ordena e arranja quaisquer outros dons que existam dos carismas e assim faz a igreja do Senhor em toda parte e em tudo é aperfeiçoada e completa" (novaciano de roma 210/280 d.C.)

"Nós conhecemos Bispos que operam maravilhas, assim como monges que não o fazem" (Atenás de Alexandria 296/373 a.C.)


St. Agostinho Diz que sua mãe teve um sonho e nesse sonho viu que ele era convertido e ainda diz que ouvia uma voz que o dizia "Toma e lê!" e ele leu o texto de romanos e se converteu. Ele afirma o seguinte: "E eu permanecia naquela fé que tantos anos antes havia sonhado a minha mãe".

"Paulo chama profetas, não a qualquer intérprete da vontade divina, mas aos que recebiam alguma revelação particular. Hoje, tais profetas não existem OU são menos visíveis". (João Calvino)

"Não excluo o dom de profecia preditiva, desde que ela esteja conectada ao dom de ensino" (João Calvino)

Charles Spurgeon, no meio do culto, interrompe a liturgia e diz a um jovem: "Meu jovem, essas luvas que você está usando, não foram compradas, você a roubou de seu patrão". Posteriormente, o fato foi conferido e confirmado.

Mostrando para nós que o ensino continuísta rompeu as barreiras do século e nos dando o exemplo a seguir.

"Os Dons serão dados aos que creem" (Mc. 16:17).

Shalom Ha'Shem!



Sobre os debatedores:
Cleuberth Lima
Maranhense, 35 anos, residente em Icatu-MA, acadêmico de Direito, Pedagogo e Bacharel em Teologia.


Renato de Oliveira Pimentel
Casado, 23 anos, Técnico em Informática, Bacharel em Teologia pela Faculdade Betesda e Pastor local na Igreja Assembleia de Deus em Nanuque - MG.


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