Por Luís Roberto de Souza*
A abordagem feita pela teologia pentecostal carece de apoio nas cartas apostólicas, na história da igreja e na teologia cristã. Uma análise feita a partir dos pilares da teologia cristã evidencia as lacunas quanto à interpretação sobre a ação do Espírito Santo na igreja. Lacunas estas que os defensores do pentecostalismo, como pregado desde os eventos da Rua Azusa em Los Angeles, no início do século XX, precisam responder para se firmarem como uma interpretação ortodoxa sobre o assunto.
Este artigo tem como
objetivo levantar tais questionamentos acerca da ausência de paralelos
doutrinários, históricos e teológicos que a visão pentecostal apresenta quando
confrontada com quase vinte séculos de existência da igreja de nosso senhor
Jesus Cristo.
Introdução
Desde sua fundação, a
igreja tem como alicerce de fé e regra a bíblia. Santa, perfeita e incapaz de
erro, ela dá luz aos questionamentos doutrinários e justifica as práticas do
culto cristão. Com os ensinamentos bíblicos, o homem recebe o Espírito Santo
como garantia divina de que está salvo (cf. efésios 1:13,14). Sem a observância
da palavra não há o conhecimento de Deus para o cristão.
A teologia bíblica é
o meio pelo qual a igreja interpreta a ação de Deus e suas relações com a
humanidade, desde antes da criação do mundo até a eternidade vindoura.
Com o decorrer da
história da igreja o entendimento teológico se apresenta de maneira paradoxal
no que diz respeito a seu conteúdo, pois se por um lado verdades cruciais para
a manutenção da salvação são imutáveis, por outro lado encontram-se abordagens
que surgiram a fim de tratar de assuntos de determinada época, dando dupla
natureza à teologia que pode ser definida como uma disciplina estática e
dinâmica, simultaneamente.
A tradição, por meio
dos credos, vem para ratificar o entendimento apostólico para preservação da sã
doutrina pura e acessível a toda igreja, de geração em geração, considerando
que “os credos históricos não partilham da autoridade final das escrituras, mas
todas as tradições evangélicas seguem os reformadores na crença que os credos
antigos são na verdade um resumo fiel das escrituras e fielmente tiram suas
implicações” (Noble, 2015 pág. 22).
Uma leitura crítica
da bíblia, mais especificamente das cartas doutrinárias e dos evangelhos,
passando pelos credos que representam o entendimento que a igreja tem sobre o
ensino apostólico e apoiando-se na lacuna histórica existente entre os eventos
descritivos de Atos dos Apóstolos e os relatados no início do século XX,
resultam em um grande desafio , de alta dificuldade, ao qual os teólogos
pentecostais precisam responder, visando a abordagem feita sobre a ação do
Espírito Santo em uma ortodoxia fundamentada e com bom argumento teológico.
Primeiro
desafio: o silêncio bíblico
A afirmação
pentecostal de que o batismo com o Espírito Santo é uma experiência subsequente
à salvação ou:
“é um revestimento de
poder do alto, com a evidência física inicial de línguas estranhas, conforme o
Espírito concede, pela instrumentalidade do Senhor Jesus, para o ingresso do
crente numa vida de mais profunda adoração e eficiente serviço para Deus” (Gilberto, 2008 pág. 191).
O ensino apostólico é
rico em explicações, comparações com tipos presentes no velho testamento,
metáforas que exemplificam e tornam as ordenanças deixadas para a igreja claras
e evidentes.
Os defensores da
paracletologia pentecostal precisam apontar quais são as referências
neotestamentárias a respeito da segunda benção a ser recebida. As cartas
doutrinárias são as explicações teológicas acerca de tudo referente à fé
cristã: os evangelhos, contendo os sermões de Cristo seus milagres e suas
explicações acerca da lei, e o livro de Atos dos Apóstolos, com seus sermões
dão à igreja uma visão clara sobre o batismo com o Espírito Santo.
Antes de afirmar que
o batismo com o Espírito Santo é algo distinto da salvação, a teologia
pentecostal precisa se desprender dos fatos relatados em Atos dos Apóstolos,
tidos como paradigmas, e adentrar às cartas ou aos evangelhos que contêm textos
didáticos e explicativos.
A composição dos
livros aceitos pela igreja como inspirados e livres de erros não dão caráter
doutrinário a um fato, ou a um conjunto de fatos, simplesmente por apresentarem
aparentes semelhanças.
Quanto a esta
diferença entre textos descritivos e explicativos, Jonh Stott afirma: “digo porém que o texto descritivo
tem valor somente até o ponto em que é interpretado pelo que é didático”
(Stott, 1964, pág. 18).
O perigo deste método
está na singularidade inerente a cada fato narrado, ao contexto histórico, ao
período de transição que a igreja vivia, pois, se um fato narrado em Atos
necessariamente deve ser constituído como exemplo doutrinário, então se abre
precedente para que todos os demais também sejam tomados como doutrina e, a
partir desta, a prática da doutrina apostólica torna-se inviável do ponto de
vista bíblico como um todo, já que estabelecer padrões normativos baseados em
eventos, como o evangelístico ocorrido entre Felipe e o eunuco, a conversão de
Paulo e o carcereiro de Filipos, trariam à tona um perfil impraticável quanto à
genuína conversão.
Em relação aos textos
de Atos, um simples olhar histórico dará ao leitor a percepção da revelação
contínua e progressiva da obra do Espírito Santo, a necessidade de concerto
entre judeus e samaritanos com certificação apostólica, a abertura do evangelho
aos gentios e a conclusão da obra dada aos últimos crentes que ainda esperavam
o Messias.
Com este simples
argumento, fica exposto que os derramamentos do Espírito, relatados em Atos dos
Apóstolos, devem passar pelo crivo das cartas doutrinárias, dos evangelhos e
dos escritos veterotestamentários para que um conceito bíblico de Batismo com o
Espírito Santo seja extraído da bíblia.
Segundo
desafio: a lacuna histórica
Considerando a
história da igreja, a teologia pentecostal precisa identificar onde a doutrina
da segunda benção foi praticada, pois qualquer tratado teológico sobre a
história da igreja cristã não fornece de maneira clara a compreensão de que os
eventos da Rua Azusa foram os pioneiros dessa natureza.
Em uma breve pesquisa
utilizando ferramentas de busca on line ou a literatura acadêmica sobre a
história da igreja como disciplina, oferecem uma visão panorâmica quanto ao
silêncio histórico sobre o batismo com o Espírito Santo sendo abordado segundo
a teologia pentecostal.
Não há relatos dos
historiadores acerca de avivamentos baseados na segunda benção ou algo que
remeta ao pentecostalismo atual.
A própria teologia
pentecostal assume esta vanguarda, desqualificando o evangelho pregado por
séculos na declaração de um renomado teólogo pentecostal: “através desta
verdade, ressurgida na Rua Azusa em Los Angeles, no início do século passado,
os pentecostais vêm anunciando o evangelho completo de nosso Senhor Jesus
Cristo em todo o mundo” (Gilberto, Lições Bíblicas, CPAD, 2009).
Com tal assertiva,
surgem questionamentos inevitáveis como: O evangelho pregado antes da Rua Azusa
teria sido incompleto?
Os avivamentos históricos
na Europa e na América, que datam de antes destes eventos, não evidenciaram
tais manifestações, sendo assim pode-se considerar que foram incompletos,
considerando o ponto de vista teológico e espiritual?
Pelo exposto, concluo
este desafio pedindo, humildemente, que os defensores da teologia pentecostal
apresentem fatos que possam coadunar o avivamento da Rua Azusa com quase vinte
séculos de existência da igreja, uma vez que, até onde é pesquisado, não há
relatos de nenhuma alusão à segunda benção, até mesmo por parte dos grandes
avivalistas.
Terceiro
desafio: o silêncio dos teólogos
Como afirmado
anteriormente, a teologia cristã é dinâmica no sentido de estar a serviço de
mudanças de culturas, costumes, e quando precisar sair em defesa da fé genuína.
No entanto, questões
tratadas desde os primórdios da teologia que são inerentes à salvação, possuem
natureza universal e imutável, como a justificação pela fé, que foi um dos
pilares reerguidos pela reforma, pois corriam o risco de se perderem com o passar
do tempo.
A teologia praticada
desde os teólogos patrísticos, os medievais, os reformados e as escolas
seguintes até o início do movimento pentecostal, sempre apresentaram a obra do
Espírito Santo, no que diz respeito aos dons, basicamente da mesma maneira, com
poucas variações, mas não há registros na literatura anterior ao movimento
pentecostal de nenhuma alusão que possa ter conexão ao pensamento pentecostal
atual.
Estariam os teólogos
equivocados por quase vinte séculos? Por que o pilar do evangelho completo,
como requerido por Gilberto, só fora dado a partir da Rua Azuza?
Considerações
finais
Não é objetivo deste
artigo questionar a genuinidade da experiência pentecostal nem tampouco excluir
a pneumatologia praticada por seus seguidores, tais questionamentos surgem após
uma breve reflexão sobre os argumentos teológicos que, baseados em narrativas,
fizeram abordagens que não são identificáveis nas cartas doutrinárias, nos
evangelhos, na tradição histórica da igreja e estão ausentes nos escritos teológicos,
em quase vinte anos de estudos.
Finalizo meu
argumento desejoso de respostas bíblicas, teológicas e históricas
necessariamente nesta ordem.
Referências
bibliográficas
Gilberto, A. (2008). Teologia
Sistemática Pentecostal (2ª edição ed.). Rio de Janeiro: CPAD.
_________. (2009). Lições bíblicas
CPAD. Jovens e Adultos.
Noble, T. A. (2015). Trindade Santa
Povo Santo a teologia da Perfeição Cristã. Maceió : Editora Sal Cultural.
Stott, J. (1964). Batismo e Plenitude
do Espírito Santo (3ª edição ed.). São Paulo: Vida Nova.
Sobre
o autor:
Luis
Roberto de Souza, Casado, 37 anos, Técnico em
Eletrotécnica, graduando em Tecnologia de Construção de Edifícios, possui curso
básico em teologia, estuda teologia de maneira autodidata, é cristão Batista de
tradição histórica. Administrador do Grupo de Estudos "Teologia com
Propósitos". Co-Editor do Blog. Escreve semanalmente sobre o tema:
“Teologia Paulina”. Contato: robertoluissouza78@gmail.com
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